domingo, 18 de julho de 2010

O CEGO DE JERICÓ E IVETE SANGALO




Viajar de ônibus tem – como quase tudo na vida – vantagens e desvantagens. Uma das vantagens (que pode não ser para alguns) é justamente o convívio com o inesperado e inusitado passageiro comum.
Barra do Piraí – Santanésia é um trecho rápido. Demora-se mais esperando o ônibus no ponto - e como! - do que efetivamente no trajeto. Duas senhoras evangélicas conversavam sobre a Ivete Sangalo: Você viu – disse uma – a Ivete incorporando espírito em pleno palco? Não?! Coloca lá no youtube: Ivete endemoninhada e você vai ver. Pensei cá comigo: Tempos atrás quem poderia imaginar um diálogo desses? E começaram a falar sobre o Apocalipse, chips implantados, catástrofes. Enfim, o mundo tinha acabado antes mesmo de chegarmos ao fim da viagem. Mas, isso foi na ida.
Na volta um cego entra no ônibus juntamente com sua acompanhante e começa um discurso eloqüente, capaz de deixar corado muito orador de carteirinha: “Uma excelente boa tarde, senhoras e senhores! Permita-me uma pequena interrupção nesta breve viagem...”. E assim foi - enquanto a acompanhante distribuía uns cartõezinhos xerocados - o seu discurso pedindo auxílio evocando as dificuldades da sua situação. De repente – como diria o Poetinha – não mais que de repente, saca de dentro de sua roupa uma... latinha de Pomarola segura por um fio amarrado por pequenos nós em furinhos nas laterais. Tudo cronometrado. Moedas tilintaram. Lá se foram as minhas também.
Logo correlacionei aquele cego do ônibus com o bíblico de Jericó. “Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!” Que queres que eu te faça?", perguntou o Senhor. Ora, alguns podem argumentar criticando obviedade: “Que pergunta?! É claro que o cego quer ver!” Será? Não creio que o Senhor tenha sido bobo ou, como querem alguns, cômico ao fazer esta pergunta. De fato, muitas vezes, nos agarramos às nossas limitações, às nossas “cegueiras” e fazemos delas uma forma de obtermos um certo carinho, uma especial atenção. Por isso, procede, sim, perguntar: Queres, de fato, ver? Ou preferes a escuridão, agarrado às suas muletas e apoios?
Conta-se que um mineirinho, no tempo dos réis, todos os dias passava por uma venda e, lá os bebedores colocavam diversas moedas na mesa. A menor tinha maior valor e a maior, menor valor. Chamavam o mineirinho e pediam para ele escolher. Ele sempre escolhia a maior (de menor valor). E todos riam aos baldes. Um dia, um cidadão virou-se para o mineirinho e disse: “Você não sabe que a moeda menor tem maior valor? Por que não a escolhe?” Ele respondeu: “Sei, sim, senhor. Mas, no dia em que eu escolhê-la, acaba a brincadeira e eu perco esse dinheirinho todos os dias.” Simples.
Temos que ter caridade. Sem dúvida! Temos também que lutar para que todos tenham dignidade. Emprego, educação, oportunidades, abrem os olhos da mente... e do coração.

Grande abraço,

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