terça-feira, 16 de março de 2010

A INVISIBILIDADE DO ÓBVIO



É de Nelson Rodrigues a afirmação de que o óbvio é invisível. Dizia isso em relação aos lances claríssimos de falta,  pênalti, cometidos nas barbas do árbitro que, inexplicavelmente, não “via”, não soprava o apito.
            Entretanto, cada um tem sua forma de enxergar as coisas. De Stanislaw Ponte Preta, contam que, em tenebrosas épocas, foi obrigado a se desdizer. Ele afirmara que metade da Câmara era corrupta. Então o fez: “Metade da Câmara não é corrupta.” Vejam só! Desdisse e tudo ficou do mesmo jeito. Um copo está meio cheio ou meio vazio? Depende... da sede.
            Belíssima explicação foi a de um Bispo a um não crente que questionou sobre como, na Eucaristia, poderia estar o Corpo de Cristo, sendo que o corpo era muitas vezes maior que o pedacinho de pão e, de como ele estaria presente tanto neste pedaço de pão como em outro ao mesmo tempo. O Bispo respondeu – como bem sabem fazer os judeus – com outra pergunta: “O que é maior: os olhos ou a paisagem? A pupila e a retina ou aquela montanha? No entanto, a montanha “cabe” dentro dos olhos”. E, sobre a concomitante presença de Cristo em vários pedacinhos de pão, argumentou: Se nos colocarmos diante de vários pedacinhos de espelho, não teremos nossa imagem refletida inteiramente em cada um deles?”.
            Deus, a quem alguns chamam de “acaso”, meus amigos, é o óbvio invisível e ululante. É tão clara a sua presença em nosso meio que chega a ofuscar! O livro da Sabedoria tem páginas belíssimas sobre esse tema: “... pois é a partir da grandeza e beleza das criaturas que, por analogia, se conhece o seu autor []... se eles possuíram luz suficiente para perscrutar a ordem do mundo, como não encontraram eles mais facilmente Aquele que é o seu Senhor?” (Sabedoria, 13).
            O que não se vê, mais do que invisível, pode se tornar temido. Talvez, por isso, muitos tenham medo de Deus. Porém, não necessariamente... É atribuída a Joaquim Nabuco a seguinte frase: “A força do desconhecido está em que ele não se presta à comparação.” Deus, invisível, fez-se invisível na pessoa amorosa do Filho. “Senhor, disse-lhe Filipe, mostra-nos o Pai e isto nos basta.” Respondeu Jesus: “Há tanto tempo que estou convosco e não me conheces, Filipe! Aquele que me viu, viu também o Pai.” (Jo, 14,8).

            Para fechar com bom humor e, para mostrar que facilmente nossos olhos podem ser levados para longe do foco que realmente interessa (como o mundo pode desviar-nos o olhar de Deus), mais uma do Sr. Stanislaw: Uma velhinha atravessava diariamente a fronteira com um saco de areia na garupa e uma moto. O guarda olhava, vistoriava, abria o saco e nada. Depois de vários dias o policial virou-se para ela e disse: “Sei que a senhora está contrabandeando alguma coisa. Pode me dizer. Não vou prendê-la”. Ela, diante dos insistentes pedidos do oficial, disse: “O senhor não vai mesmo me prender?”. “Não. Pode ficar tranquila. Agora, diga: O que a senhora contrabandeia? Ela respondeu: “Moto”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Dê sua opinião sobre o texto. Obrigado.