Há algum
tempo ouvi – da interpretação conjunta dos textos bíblicos “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança” e “Amai o próximo como a ti mesmo” -
a seguinte conclusão: “Deus nos fez semelhantes
a Ele e, próximos uns dos outros.
Antonio Carlos Santini escreveu interessante artigo
intitulado “Admirar o próximo” –
Jornal O Lutador – 1º a 10 de janeiro 2010 – onde faz-nos perceber o quanto
é difícil valorizar o irmão que está ao nosso lado, o “próximo mais próximo”.
Preferimos admirar o “próximo mais longe”. Ele diz que: “Exatamente por serem
distantes, só vemos a aura luminosa que a propaganda nos transmite ao seu
respeito. Mesmo quando se revestem de graves fragilidades [...] fechamos os
olhos para os seus vícios e defeitos para simplesmente, ad-mirar... Já o nosso próximo...
Pobre do nosso próximo.”.
“Cartas de
um diabo a seu aprendiz”, de C.S. Lewis, da Editora Martins Fontes. O autor
imagina as missivas expedidas por um diabo adulto, Fitafuso, a seu sobrinho, Vermebile, ainda um aprendiz na “arte”
de tentar e desviar o homem do “Inimigo”. Entenda-se, aqui e onde quer que seja,
Deus, por inimigo dos demônios.
Fitafuso vê o homem como seu “paciente” – como
se a bondade, o amor e a fé fossem terríveis doenças a serem curadas – e,
também, o “humano” como um ser composto de círculos concêntricos.
Pois bem. Para
corroborar o que disse Santini e reafirmar que Deus nos fez próximos
para, sim, podermos nos amar e nos
ajudar, transcrevo abaixo a técnica diabólica ensinada por Fitafuso – o tio diabo - ao inexperiente e atrapalhado Vermebile, para afastar-nos do que
realmente interessa:
“O que quer que
você faça, sempre haverá alguma benevolência,
assim como alguma animosidade, na alma do seu paciente. O melhor a fazer é
voltar a animosidade para os semelhantes mais próximos, aqueles que ele
encontra todos os dias, e voltar a benevolência para um círculo mais distante, para as
pessoas que ele não conhece. Desse modo, a animosidade torna-se completamente
real e a benevolência, em grande
medida, imaginária. Não há nenhuma vantagem em inflamar o ódio que ele
sente pelos alemães se ao mesmo tempo o pernicioso hábito da caridade cresce
entre ele e a mãe, o chefe ou o homem que ele encontra no trem. Imagine seu
homem como uma série de círculos concêntricos, sendo que o central é a sua
vontade, o seguinte o seu intelecto e o exterior a sua fantasia. Não adianta
alimentar a esperança de eliminar de todos os círculos tudo aquilo que lembre
remotamente o Inimigo (Deus), mas você deve continuar jogando para cada vez
mais longe do centro todas as virtudes, até que finalmente fiquem localizadas
no círculo da fantasia, e todas as características desejáveis fiquem no círculo da
Vontade. Somente quando alcançam a Vontade, e lá se materializam como hábitos, é que as virtudes são
fatais para nós.”
Quem
diria, hein?! Não, amigo leitor,
o Inferno não é passar a eternidade procurando uma vaga para estacionar no
Centro; ou tentando abrir saquinhos plásticos de supermercados. Não. E, não
somente com rabos e chifres deveriam ser representados os demônios. Caberia acrescentar um belo
terno italiano, sapatos alemães, charuto cubano à boca, óculos pince-nez e, ao fundo, diplomas de graduação,
pós-graduação, Mestrado e Doutorado em comportamento humano.
Grande abraço,
Saulo Soares.