sábado, 16 de agosto de 2014

OUTRAS HORAS

São outras as horas que percorro,
Como outras são as mortes das quais morro diariamente.
São vários os tempos e as distâncias,
Os vértices e as vertentes,
Vou da velhice à infância,
Do saber a ignorância,
Num breve momento em que sou ausente.

Vou. E não volto,
Como as águas às nascentes o fazem,
O Piraí me leva e em mim planta
O deserto, a sede e a miragem.

Vou. E não volto,
O Piraí me leva entre garças, capivaras e tucunarés.
Vou. E não volto,
Pois já não sou eu mais quem canta:
Quem canta és tu! Mas quem tu és?

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

NAU

Já é tarde: escuto essa voz...
Tarde para o que sonhaste tanto:
Preparaste demais...

Tarde para ir ou voltar,
Já não há mais tempo, já não há mais canto:
Preparaste demais...

Não há vento, nem velas a inflar,
Tintas ou telas, navios ou mar.
Ficaste no indeciso cais, ó Homem, ó Vida: Preparaste demais!

Foi-se a ousadia, o passo que não deste,
O traço que à caneta recusaste,  a voz que à garganta emudeceste!
Escolheste o medo, o lúgubre,
Sucumbiste ao dedo que em riste acusa:
Preparaste, demais e amiúde, ó triste alma difusa!